Páginas

terça-feira, 25 de junho de 2013

Um gigante adormecido nunca acorda de bom humor

Movimento em Itabuna dia 20/06/2013 (Foto: Naudielle Silva)

Por Naudielle Silva*
 
Em maio de 1968 minha mãe ainda estava nascendo, em 1984 eu não era sequer uma ‘sementinha’, portanto não vi as Diretas Já, e em 1992 eu era ainda muito pequena para entender os Caras Pintadas que estavam nas ruas. Exatamente por isso é com imenso orgulho (e arrepiada!) que vejo minha geração se levantar numa marcha de revolta. Os movimentos contra a corrupção foram pontuais na primeira década dos anos 2000, mas se tornaram [incrivelmente] uma rotina nessa semana de junho de 2013.

Todos dizem que o gigante acordou. E um gigante adormecido nunca acorda de bom humor, não mesmo! Temos urgências a resolver e por isso mesmo esse é um movimento bonito de se ver, especialmente, por sabermos que não estamos mais no mesmo lugar. O movimento balançou o país, não somos mais os mesmos. A marcha nasceu contra os R$0,20 centavos de aumento nas passagens de transporte coletivo e cresceu para um movimento muito além desse valor. O movimento que chama o povo pra rua ganhou força pelo repúdio ao impedimento de protestar e pela revolta contra a violência praticada por policiais que tem, inclusive, seus salários pagos com o dinheiro público.

A revolução inesperada deixou políticos boquiabertos. Nasceu do povo, sem guetos, sem partidos e sem grandes líderes. Se espalhou pelo país, invadiu a mídia, as casas, o mundo e se apossou de uma música de fins [inicialmente] comerciais para mobilizar uma multidão. A música “Vem pra Rua” criada para uma campanha publicitária se tornou real em mais de 100 cidades brasileiras.

O povo fez da rua “a maior arquibancada do Brasil”. Eles estão nas ruas! Se organizaram pelas redes sociais e se encontraram não simplesmente para ver os jogos, como a propaganda sugere, mas para reivindicar melhorias para a população, o fim da corrupção, o direito de manifestação e tantas outras pautas hoje vistas em cartazes e ouvidas em coro.

Muitos intelectuais estão tentando entender e explicar o movimento, mas ainda não conseguem dimensioná-lo. Muitos falam da baderna e violência, mas elas vêm de um grupo menor, radical, destruidor e saqueador. Um grupo formado por marginais que já saem de casa com a predisposição de se aproveitar do movimento para barbarizar. Eles destroem o patrimônio público e nem sequer percebem que o dinheiro utilizado para refazer o que foi devastado poderia ser usado para melhorar os serviços para a comunidade.

Não podemos deixar que a baderna minore a legitimidade de uma causa que é muito maior. Não podemos deixar que esse clamor por mudança se apague ou que a força esfrie. O gigante acordou, no entanto precisa mostrar que é dono da casa. O gigante não pode esquecer que ele é quem escolhe os governantes e financia a arrecadação nacional.

Para entender a questão dos R$0,20 centavos não precisamos ir muito longe. Basta enfrentar o empurra-empurra para entrar nos ônibus na porta da UESC em horários de pico ou ver de perto a situação de ônibus, trens e metrôs nas maiores cidades do país. Quem nunca viu isso talvez não entenda que não é só por R$0,20 centavos. Quem nunca sobreviveu com um salário mínimo, talvez nunca entenda que os R$0,20 centavos multiplicados por quatro conduções ao dia, nos 20 dias úteis do mês, significam R$160,00 que poderiam ser investidos em comida, cursos ou simplesmente ficar no bolso do cidadão e não de uma empresa que não respeita seus usuários/clientes.

Dia desses assistindo a execução do Hino Nacional, pela TV, um amigo convocou a todos que estavam na sala para ficarem de pé, um ato de respeito que para geração dele é instintiva, mas para a minha nem sempre é. Desde então tenho prestado atenção ao Hino sendo cantado pelos manifestantes nas ruas e percebi que essa obra de arte de mais de 100 anos sempre nos chamou para a luta, pena que só agora ouvimos.

Percebi que o Hino representa um chamamento, uma convocação e agora uma realidade. Os autores, confiando de antemão nas futuras gerações, asseguram que os filhos desta Terra não fogem a luta e não a temem. Um povo heroico, de brado retumbante, que precisa lutar pelo “gigante pela própria natureza”. Precisa [mesmo!] lutar pela “paz no futuro”, consequência da “glória no passado”. É no nosso presente que construiremos a paz e o progresso para nossos filhos, como fizeram por nós os jovens das gerações passadas.
Insista! Persista! Juntos! Somos muitos!


Nenhum comentário:

Postar um comentário