Por Naudielle Silva*
Em maio de 1968 minha mãe ainda estava nascendo, em 1984 eu não era
sequer uma ‘sementinha’, portanto não vi as Diretas Já, e em 1992 eu era
ainda muito pequena para entender os Caras Pintadas que estavam nas
ruas. Exatamente por isso é com imenso orgulho (e arrepiada!) que vejo
minha geração se levantar numa marcha de revolta. Os movimentos contra a
corrupção foram pontuais na primeira década dos anos 2000, mas se
tornaram [incrivelmente] uma rotina nessa semana de junho de 2013.
Todos dizem que o gigante acordou. E um gigante adormecido nunca
acorda de bom humor, não mesmo! Temos urgências a resolver e por isso
mesmo esse é um movimento bonito de se ver, especialmente, por sabermos
que não estamos mais no mesmo lugar. O movimento balançou o país, não
somos mais os mesmos. A marcha nasceu contra os R$0,20 centavos de
aumento nas passagens de transporte coletivo e cresceu para um movimento
muito além desse valor. O movimento que chama o povo pra rua ganhou
força pelo repúdio ao impedimento de protestar e pela revolta contra a
violência praticada por policiais que tem, inclusive, seus salários
pagos com o dinheiro público.
A revolução inesperada deixou políticos boquiabertos. Nasceu do povo,
sem guetos, sem partidos e sem grandes líderes. Se espalhou pelo país,
invadiu a mídia, as casas, o mundo e se apossou de uma música de fins
[inicialmente] comerciais para mobilizar uma multidão. A música “Vem pra
Rua” criada para uma campanha publicitária se tornou real em mais de
100 cidades brasileiras.
O povo fez da rua “a maior arquibancada do Brasil”. Eles estão nas
ruas! Se organizaram pelas redes sociais e se encontraram não
simplesmente para ver os jogos, como a propaganda sugere, mas para
reivindicar melhorias para a população, o fim da corrupção, o direito de
manifestação e tantas outras pautas hoje vistas em cartazes e ouvidas
em coro.
Muitos intelectuais estão tentando entender e explicar o movimento,
mas ainda não conseguem dimensioná-lo. Muitos falam da baderna e
violência, mas elas vêm de um grupo menor, radical, destruidor e
saqueador. Um grupo formado por marginais que já saem de casa com a
predisposição de se aproveitar do movimento para barbarizar. Eles
destroem o patrimônio público e nem sequer percebem que o dinheiro
utilizado para refazer o que foi devastado poderia ser usado para
melhorar os serviços para a comunidade.
Não podemos deixar que a baderna minore a legitimidade de uma causa
que é muito maior. Não podemos deixar que esse clamor por mudança se
apague ou que a força esfrie. O gigante acordou, no entanto precisa
mostrar que é dono da casa. O gigante não pode esquecer que ele é quem
escolhe os governantes e financia a arrecadação nacional.
Para entender a questão dos R$0,20 centavos não precisamos ir muito
longe. Basta enfrentar o empurra-empurra para entrar nos ônibus na porta
da UESC em horários de pico ou ver de perto a situação de ônibus, trens
e metrôs nas maiores cidades do país. Quem nunca viu isso talvez não
entenda que não é só por R$0,20 centavos. Quem nunca sobreviveu com um
salário mínimo, talvez nunca entenda que os R$0,20 centavos
multiplicados por quatro conduções ao dia, nos 20 dias úteis do mês,
significam R$160,00 que poderiam ser investidos em comida, cursos ou
simplesmente ficar no bolso do cidadão e não de uma empresa que não
respeita seus usuários/clientes.
Dia desses assistindo a execução do Hino Nacional, pela TV, um amigo
convocou a todos que estavam na sala para ficarem de pé, um ato de
respeito que para geração dele é instintiva, mas para a minha nem sempre
é. Desde então tenho prestado atenção ao Hino sendo cantado pelos
manifestantes nas ruas e percebi que essa obra de arte de mais de 100
anos sempre nos chamou para a luta, pena que só agora ouvimos.
Percebi que o Hino representa um chamamento, uma convocação e agora
uma realidade. Os autores, confiando de antemão nas futuras gerações,
asseguram que os filhos desta Terra não fogem a luta e não a temem. Um
povo heroico, de brado retumbante, que precisa lutar pelo “gigante pela
própria natureza”. Precisa [mesmo!] lutar pela “paz no futuro”,
consequência da “glória no passado”. É no nosso presente que
construiremos a paz e o progresso para nossos filhos, como fizeram por
nós os jovens das gerações passadas.
Insista! Persista! Juntos! Somos muitos!
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